Quase 5 anos depois, eis um artigo que se mantém actual - infelizmente para Sintra!...
"Reina a confusão"
Edite Estrela - in Jornal de Notícias - JN - 23/2/2003
Não se tem falado bem de Sintra. Mais precisamente da Câmara de Sintra. Pelas mais variadas razões, o segundo maior concelho do país parece andar em "maré de azar", para utilizar as palavras de um jornalista do JN. O "slogan" de campanha do actual presidente, "para que se fale bem de Sintra", parece ter sido um mau prenúncio. Voltou-se o feitiço contra o feiticeiro, alegam os desapontados.
Os títulos das notícias falam por si: "Governo pára modernização do comércio", "Centro de Saúde à beira da ruptura", "Falhas de luz", "Básica inaugurada por Durão sem gás nem cantina", "Sintrense leva deputado do PSD a tribunal", "Gabinete da Câmara arrombado", "Ruptura nos lixos urbanos", "Chuva de pedras em Sintra", "Explosões arrasam 11 prédios", "Assaltos preocupam habitantes", "SMAS de Sintra responsáveis por descargas poluentes no Jamor", "Demissões em Sintra somam e seguem", "Vereadora do Trânsito acusa o presidente de prepotência e de sonegar informações ao executivo". E para rematar o extenso rol, "Seara prometeu "surpresas"". Muito sugestivo, mas se as "surpresas" são estas, decerto que os munícipes as dispensavam.
Os funcionários estão desmotivados, porque falta em estratégia e direcção política o que sobra em instabilidade e desassossego. Os cidadãos estão impacientes, porque não obtêm respostas e vêem desmotivação e inércia nos serviços. Não há uma única obra, um só projecto em curso, que seja da autoria do actual executivo. E não é por falta de recursos financeiros. Felizmente, dinheiro não tem faltado. Os cofres municipais estão bem recheados, mercê da boa situação financeira herdada. O défice, em Sintra, não é orçamental, é de estratégia e motivação. Falta capacidade de decisão e faltam soluções para os problemas das pessoas.
Sintomático e bem ilustrativo da paralisia municipal é o projecto da "Casa das Selecções". Vinha de trás e esperava-se que, por razões óbvias, andasse mais depressa. Não evoluiu e o Euro 2004 está à porta.
Os desentendimentos no círculo mais restrito da maioria camarária sobem de tom, passam para o exterior e as demissões sucedem-se. E se o afastamento do chefe de gabinete do presidente da Câmara se processou de forma discreta - outra coisa não se esperava de um magistrado, se bem que, às vezes, os silêncios são mais eloquentes que as palavras - o mesmo não aconteceu com a equipa do Urbanismo.
António Lemos Cardoso que, em Abril passado, para ser nomeado director municipal do Planeamento Estratégico e Urbanismo precisou de um despacho do primeiro-ministro, porque já se tinha reformado, não poupa quem o convidou. Em declarações à Comunicação Social e na carta de demissão acusa o edil de Sintra de não "enfrentar os interesses instalados", de usar "formas ínvias para se informar do quotidiano menor da gestão da casa" e de ter "despedido" a equipa de "maneira pouco frontal". Acusações graves, que o visado ainda não contestou. Curiosamente, também ainda não explicou ao executivo municipal as razões de todas essas demissões.
É curioso o desabafo do demitido responsável do Urbanismo, perplexo pelo facto de a equipa ter sido elogiada e "despedida" pelo mesmo presidente e quase em simultâneo: "Ou somos todos malucos e não batemos bem da bola, ou há qualquer coisa". Era interessante conhecer qual é a "coisa" que o intriga. Pode ser que os desenvolvimentos do assunto tragam importantes revelações.
As divergências no interior da própria coligação pré-eleitoral são iniludíveis. Não é só o que se diz, é também o que se vê. E com os vereadores comunistas (com pelouros) a guerra já começou, com a vereadora do Trânsito a acusar o presidente de "prepotência e arrogância". Palavras que não podem ficar sem resposta, a menos que o autarca se reconheça no retrato traçado.
Preferia que isto não estivesse a acontecer. Que não tivesse razões para escrever que, na Câmara de Sintra, reina a confusão. Seria mesmo mais cómodo não escrever sobre o assunto, desligar o interruptor e não querer saber. Seria mais fácil, sem dúvida, se o meu modo de ser fosse outro. Para mim, fazer de conta é cobardia e calar é uma forma de cumplicidade. Prefiro ser mal interpretada, mas sentir que cumpri o dever."
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