quinta-feira, 22 de março de 2012

Regresso ao passado

Um destes dias, cerca das 21 horas, regressava a casa, a pé, depois de ter concluído sessão de formação que estive a conduzir em horário pós-laboral.


À minha frente caminhava um grupo de 5 pessoas - um casal na casa dos 30 e poucos anos e, pelo que pude aperceber-me, três filhos, de idades entre os 12 / 13 anos e uma pequenita com cerca de 4 ou 5. Pelo percurso que faziam concluí que vinham da igreja local, que àquela hora mantinha ainda aberta uma área de distribuição de alimentos e outros produtos para apoio a famílias necessitadas, creio que com apoio da Junta de Freguesia.


O homem e a mulher levavam grandes sacos onde era possível vislumbrar arroz, massas, batatas, enfim, os víveres necessários para a alimentação do mês. Todas as crianças ajudavam, transportando também sacos mais pequenos com alimentos, incluindo a pequenita, que saltitava e sorria, na inconsciência e pureza da sua tenra idade.


Fui vendo aquela família dirigir-se para casa, em silêncio, no início da noite, saberá Deus com que preocupações para o dia seguinte, talvez com o desemprego a roer a alma, talvez já com a ameça de perder a habitação, certamente um espaço para o medo e incerteza para criar e educar os três filhos... Serão milhares, infelizmente, as famílias portuguesas nesta situação... Mas aquela, sem o saber, acordou em mim a memória de um outro tempo distante em que também vi os meus pais fazerem mil e um malabarismos para viverem com dignidade, numa outra época difícil, sem que nada faltasse aos filhos, mas onde tantas vezes as dificuldades apertavam o coração na calada da noite. Regressou este meu País às trevas da fome, do desemprego, da miséria envergonhada, da incerteza no futuro...


Numa curva mais adiante, a família carregada de sacos com alimentos para o mês, desapareceu - antes de entrar em casa e regressar para junto da minha própria família tive que fazer um breve momento de espera, apenas o tempo do vermelho dos olhos e da pressão no peito já não serem visíveis para os meus.


Mas não consigo esquecer aquela menina que, de saquito com alguns alimentos na mão, inocente, livre, doce, saltitava no meio da família que, abrigada pelo anonimato da noite, carregava o parco sustento para escassas semanas...

1 comentário:

Anónimo disse...

Vivo junto à Igreja e todas as quintas-feiras pelas 9 horas da manhã já se ve, as pessoas formarem fila à espera das 15 horas, para a distribuição dos alimentos, infelizmente cada semana que passa a fila vai aumentando é impressionante as familias com carências e quantas serão aquelas que têm vergonha!
Ao ler esta notícia fiquei a pensar que os politicos deviam sair mais vezes à rua,conviver com o povo, afim de ver a realidade que nos rodeia.
Bem haja