sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

PISA 2009


Excelente a crónica de Fernanda Câncio publicada no DN de hoje. Transcrevo com a devida vénia:


A grande pirraça


"Os resultados do PISA 2009 são uma bofetada de luva branca dos professores na ministra que os maltratou. Aos enxovalhos, responderam com trabalho. A qualidade dos professores é a mesma, antes e depois." A ideia, lida no Twitter de Luís Azevedo Rodrigues (que se apresenta como paleontólogo), é uma caricatura das reacções que a melhoria abrupta dos resultados dos estudantes portugueses numa avaliação da OCDE que inclui 65 países está a causar. Quando não se desvaloriza a progressão - dizendo, como o "especialista" Santana Castilho, que "é um acaso" ou, como a dirigente do PSD Paula Teixeira da Cruz, "que não espelha a realidade" -, nega-se a possibilidade de a mudança verificada em relação aos anteriores estudos PISA, de 2000, 2003 e 2006, se dever a medidas tomadas por Maria de Lurdes Rodrigues, do plano de acção para a matemática ao plano nacional de leitura, das aulas de substituição ao estudo acompanhado, dos planos de recuperação de alunos com maus resultados à avaliação dos professores. Assim, se a Fenprof jura que a mudança é "mérito de professores e alunos e não de políticas educativas", o paleontólogo citado formula a teoria da pirraça: para provar à ministra que era um insulto dizer que os professores tinham de trabalhar mais e provar a sua eficácia, estes trabalharam mais e melhoraram a eficácia.

Sim, tem pilhas de graça. Mas é sobretudo doentio. Saber que, em três anos, os alunos de 15 anos portugueses, numa progressão que é a mais expressiva da OCDE, deixaram para trás as pontuações deprimentes dos anteriores relatórios e se aproximaram da média da organização - em testes, iguais para todos os países, de avaliação das competências em matemática, leitura e ciências - e que aquele que era o pior indicador da escola nacional, a relação directa entre a origem socioeconómica do estudante e os seus resultados, é finalmente vencido, com Portugal a surgir como "o 6.º país da OCDE cujo sistema educativo melhor compensa as assimetrias socioeconómicas (...), um dos países com maior percentagem de alunos de famílias desfavorecidas que atingem excelentes níveis de desempenho em leitura" devia levar toda a gente a entusiasmar-se e a tentar perceber o que contribuiu para isso, de modo a continuar o bom trabalho. Mas a reacção é de desconfiança, como quem diz: "isto só pode ser mentira". E porquê? Primeiro, porque é pecado pôr sequer a hipótese de uma coisa tão boa ser fruto de medidas governativas; segundo, porque somos uma porcaria de País, o desgraçadinho das estatísticas internacionais; terceiro, porque a escola pública é um fracasso, um sorvedouro de impostos que só produz indisciplina e analfabetos (como, aliás, os anteriores relatórios PISA "provavam"). Pôr assim em causa, de uma assentada, toda a nossa fé só pode ser uma pirraça do destino. Uma partida, sem consequências. Até porque a ministra maldita já era, se tudo correr bem as suas medidas terão o mesmo caminho."

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