terça-feira, 13 de julho de 2010

Alternativa?...


O PSD levou a efeito umas Jornadas Parlamentares para as quais convocou um conjunto de “sábios” para se pronunciarem sobre a actual situação económico-financeira do País. De entre os presentes destacavam-se os nomes de Ernâni Lopes e Luís Campos e Cunha, personalidades sobejamente conhecidas destas lides, ex-responsáveis ou quadros do Banco de Portugal, ex-governantes com responsabilidades na gestão das Finanças, etc.

Sob o tema “Alternativa como pano de fundo” (suponho que esta alternativa seja o PSD, obviamente), lá assistimos ao habitual zurzir no Governo de José Sócrates e à apresentação das “soluções” para, supostamente, levar o País a bom porto.

Ernâni Lopes não foi de meias medidas – se fosse agora responsável pela pasta das Finanças, diminuiria imediatamente os salários dos funcionários públicos entre 15 a 20%! E acrescentou de forma peremptória, segundo notícia do jornal Publico: “A cru. Sem explicar nada. Ou melhor, explicando que ou é assim ou não é. Não querem, então não se faz”.

Já Luís Campos e Cunha enveredou pela reflexão sobre o sistema político, sugerindo que seria uma “melhoria” para a Democracia se os partidos (a Direcção dos partidos, pressupõe-se) pudessem “indicar” um ou dois deputados para estarem sempre representados no Parlamento…ainda que não tivessem sido eleitos!... Defendeu ainda que o “voto em branco” tivesse expressão na AR. Finalmente, e no que toca à "remuneração da função política", o economista considerou que "não há nada mais caro do que pagar pouco" (estaria Ernâni Lopes a ouvir?...), sugerindo que os políticos fossem remunerados tendo por base “a média de IRS declarada nos últimos três anos, mais 25 por cento em cima, ou dez por cento, ou quinze por cento, o que fosse"… Mas acima, claro – aqui, nada de “cortes”…

Confesso que nada disto me parece novo (há aqui a clara repetição de uma “matriz” ideológica de Direita, sobejamente conhecida) mas não deixo de achar espantoso que gente tão ilustre, tão conhecedora, com currículos tão vastos, nada mais consiga propor, para construção de um novo futuro, do que cortes de salários já de si baixos (na sua maior parte), como acontece com os funcionários públicos. Esta é a “solução”?!... Como se conjuga essa medida com a grave situação de endividamento das famílias, por exemplo? Deixando de poder pagar os compromissos assumidos que implicações surgiriam no tecido económico? Que crescimento da economia se pretende obter, propondo que milhares de famílias percam grande parte do seu vencimento e, em simultâneo, o Estado não invista e desista de um conjunto de obras públicas?

Sinceramente, não entendo…

A este propósito da racionalidade e poupança de recursos do Estado, recordo a actuação (positiva) do Ministro Teixeira dos Santos quando, em 2006, alterou a lei orgânica do Banco de Portugal e aprovou o novo estatuto do gestor público. O objectivo de ambas as iniciativas visou acabar com um conjunto de regalias dificilmente compreendidas pelos portugueses, nomeadamente na atribuição de pensões de reforma ao fim de poucos anos e outros benefícios com elevados custos para o erário público.

Antes destas medidas, e segundo um estudo realizado pelo “Central Banking Journal”, o Banco de Portugal era a terceira instituição de supervisão que mais gastos tinha com pessoal em percentagem do PIB (0,08 por cento) entre os 30 países da OCDE, só superado pelos congéneres grego e islandês. De acordo com o Relatório Anual de 2006, para conseguir pagar as reformas e as pensões (complemento de salário pagos a antigos funcionários) aos mais de mil beneficiários, a autoridade monetária teria recorrido quase todos os anos a injecções de capital «extraordinárias» no fundo de pensões. No passado, esses reforços financeiros chegaram mesmo a prejudicar os resultados do exercício, penalizando os dividendos e impostos que o banco central paga anualmente ao Estado. Ou seja, chegou a penalizar as contas públicas, situação que foi normalizada com recurso a novos métodos contabilísticos. Só durante o mandato de Vítor Constâncio o fundo, que serve para pagar as reformas, pensões e o acesso a cuidados de saúde aos quatro mil beneficiários (activos, pensionistas e reformados) do Banco de Portugal, beneficiou de seis reforços «extraordinários», num valor global superior a 251 milhões de euros.

Luís Campos e Cunha foi vice-governador do Banco de Portugal durante 6 anos, tendo obtido uma reforma, por esse período de trabalho, no valor de 114 000 euros / ano, segundo informação que veio publicada na imprensa. Ernâni Lopes também usufrui de uma reforma do Banco de Portugal, no valor de 2 115 euros / mês. Obviamente que não está em causa a legalidade com que obtiveram essas reformas, acumuláveis certamente com outras remunerações que auferem. Mas para além de nunca os termos visto, anteriormente, a defender ou concretizar o conjunto de medidas que Teixeira dos Santos levou a cabo nesta matéria, choca ver a facilidade com que pessoas que, ao fim e ao cabo, sempre foram privilegiadas pelo sistema, falam em cortar salários de trabalhadores, num contexto já de si tão complexo e difícil para a maioria das famílias portuguesas.

Corte-se no desperdício. Corte-se no luxo gratuito. Cortem-se mordomias e benesses de quem até já ganha chorudos salários. Cortem-se cartões de crédito e viaturas de alta cilindrada. Cortem-se gastos inúteis em consultorias para dar “pareceres”, na maior parte das vezes repetidos ou inúteis. Cortem-se acumulações de pensões milionárias. Corte-se onde se deve – não onde é mais fácil ou no pouco de quem já vive com mil e uma dificuldades!

Para quem ainda tem dúvidas sobre quais serão as traves mestras da política económica a prosseguir por um eventual futuro Governo do PSD, creio que estas Jornadas também foram esclarecedoras relativamente à “alternativa” que se está a preparar.

Que depois ninguém diga que “não sabia” ou não existiram avisos…

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